Maria, a Judia, Primeira Mulher Alquimista

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Maria, a Judia” é a forma como diversos textos se referem à (talvez) primeira mulher alquimista.

Não se sabe, com certeza, a época em que ela viveu. Alguns estudiosos acreditam que Maria, a judia, teria sido irmã de Moisés, o condutor do povo judeu; ou, ainda, Sara, mulher de Abraão.

A antiguidade da primeira alquimista é confirmada por Zózimo, que, no século IV, já reportava escritos dela em suas citações sobre os sábios antigos.

É atribuído a ela a autoria do famoso “banho Maria” utilizado, não só na alquimia, como na culinária até os dias de hoje.

Em meio a tanto mistério, existe um texto reconhecidamente aceito como autêntico: “Diálogo de Maria e Aros sobre o Magistério de Hermes”, que apareceu no quinto volume do “Teatro Químico”, nas “Alegorias dos Sábios” e em “Ars Aurífera”, com o título “Incipit Pratica Marie Prophetissae in Artem Alchemicam”.

O texto abaixo é da obra “Os Alquimistas Judeus”, autoria de Raphael Patai. Uma das obras recomendadas para leitura na Irmandade Hermética da Sagrada Arte, IHSA.

Com esta leitura, você terá contato com a genuína alquimia. Caso tenha o chamado, sentirá um forte desejo em aprender mais.


Maria, a Judia

Os primeiros alquimistas não funcionais do mundo ocidental viveram, até onde se pode afirmar com certeza, no Egito do período helenístico. Dentre eles, a personagem mais antiga foi Maria Hebraea, Maria, a Hebreia, ou Maria, a Judia, sobre a qual nossa fonte principal é Zózimo, o panopolitano.

Zózimo é o primeiro autor alquimista grego cujos escritos autênticos chegaram até nós. Ele viveu no Egito helenístico, por volta de 300 d. C., e escreveu um número impressionante de obras; das quais vinte e duas foram publicadas em edição bilíngue, com o original grego e a tradução francesa, por Marcellin Berthelot.

Zózimo também escreveu, juntamente com sua irmã Eusébia, uma enciclopédia química em vinte e oito livros, da qual restaram apenas fragmentos, também publicados por Berthelot.

Nada se conhece sobre a vida de Zózimo, mas em geral se admite que era originário de Panópolis, Tebas, e que viveu em Alexandria.

Em sua maior parte, os escritos de Zózimo consistem em longas citações de autoridades da alquimia mais antiga. As autoridades que ele cita mais frequentemente são o (Pseudo-) Demócrito, a quem ele se refere como “o filósofo”, e Maria, a Judia, a quem ele, em geral, chama simplesmente de Maria, embora ocasionalmente ele a designe como “a divina Maria”.

Apesar das referências frequentes de Zózimo a Maria, seus escritos praticamente não nos dão nenhum indício de quando e onde ela viveu. No entanto, em seu tratado sobre “A água Divina”, Zózimo nos diz:

A operação de calcinar [é] a que todos os antigos louvaram. Maria, a primeira, diz: O cobre calcinou com enxofre.

Zózimo

Numa outra passagem, Zózimo mencionou um estudo, Sobre Fornos e Instrumentos (Peri kaminon Kai organon), que, ao que parece, foi escrito por Maria, e se refere a ele como um escrito “dos escritos”.

Ele faz essa referência, recusando-se a atender o pedido de sua irmã Teosébia, que lhe pedira informações sobre o assunto: ele admite ser incapaz de abordá-lo de forma mais competente do que fora feito nesse antigo estudo.

Com base nessas referências a Maria como a primeira entre os autores antigos, podemos concluir que ela deve ter sido pelo menos duas gerações antes do próprio Zózimo. Assim, podemos afirmar, com a devida cautela, que ela teria vivido o início do século III d. C., o mais tardar.


Os Instrumentos de Maria

Existem vários instrumentos utilizados na alquimia que foram inventados ou descritos por Maria; pela forma como Zózimo a cita, é impossível determinar quando se trata de uma alternativa ou de outra.

Maria construiu e descreveu vários fornos e instrumentos para cozer e destilar, feitos de metal, barro e vidro.

Ela ligou, ajustou e calafetou as várias partes desses instrumentos, empregando gordura, cera, cola de amido, argila gorda e a “argila filosofal”.

Ela considerava os recipientes de vidro especialmente úteis, porque “eles veem sem tocar” e permitem a manipulação segura de materiais perigosos, como mercúrio, que ela descreve como “o veneno mortal, porque dissolve o ouro, e o mais nocivo dos metais”, bem como de substâncias “sulfúricas” (termo com o qual ela muitas vezes quer dizer “arsênicas”), que servem para o preparo da “agua divina”.

O mais famoso instrumento da alquimia inventado, ou usado e descrito, por Maria, é o balneum Mariae, ou banho-maria, constituído por recipiente duplo, cuja parte externa é preenchida com água enquanto a parte interna contém a(s) substância(s) quem deve(m) ser aquecida(s) em fogo brando.

Se Maria realmente inventou esse aparelho ou se, como Lippman tentou demonstrar, ele já era usado séculos antes dela, tendo sido descrito por Hipócrates e Teofrasto e sendo atribuíd o a Maria em resultado de uma cadeia de circunstâncias fortuitas, o fato é que a fama e o prestígio de Maria fizeram com que essa forma de aquecimento fosse associada a ela, sendo até hoje conhecida, tanto nos laboratórios de química quanto na cozinha, como bain-marie, em francês, e Marienbad, em alemão.

Maria também fornece a mais antiga descrição de um destilador. Um destilador típico era constituído, e ainda é, por três partes: um recipiente no qual o material a ser destilado é aquecido, uma parte fria, para condensar o vapor, e um balão de recolhimento. O nome grego do destilador, kerotakis, era derivado do nome da paleta na qual os antigos pintores gregos misturavam seus quatro pigmentos básicos, branco, preto, amarelo e vermelho, com cera (keros).

A placa de metal triangular ou retangular, que servia como kerotakis, devia ser mantida quente, para impedir a cera de endurecer. Os alquimistas usavam o kerotakis de uma forma semelhante, para amolecer os metais e misturá-los com agentes corantes, sendo esse um dos principais métodos empregados na tentativa de transmutar metais comuns em ouro ou prata.

Mais tarde, o kerotakis se transformaria num aparelho composto por três partes que, em sua forma mais simples, consistia em um recipiente sob uma placa, no qual eram colocados substâncias voláteis, próprias para atacar metais, enquanto sobre ele ficava uma cúpula invetida, na qual os vapores eram consensados em líquido. Na própria placa, eram colocados os metais a ser tratados.

Em seu trabalho sobre forno e utensílios, da qual foi extraída a passagem acima, Zózimo, ao que parece, faz pouco mais que citar ou parafrasear o texto escrito por Maria.


Os métodos de Maria

Vamos começar com as instruções de Maria para o preparo da pedra filosofal. De acordo com o autor alquimista anônimo do início do século XVII, comumente designado como Cristiano, ela teria discursado da seguinte maneira:

Inverta a natureza e você encontrará aquilo que busca. Existem duas combinações: uma diz respeito à ação de branqueamento, a outra à de amarelamento; uma é realizada por meio de trituração (redução a pó), a outra, por calcinação (redução a um estado quebradiço). Pulveriza-se de maneira sagrada, com simplicidade, somente no santuário, aí ocorre a dissolução e a deposição. Combine, diz Maria, o macho com a fêmea e você encontrará aquilo que busca. Não se preocupe em saber se a obra está no fogo. As duas combinações recebem muitos nomes, tais como, salmoura, água divina incorruptível, água de vinagre, água do ácido do sal marinho, de óleo de mamona, de rábano silvestre e de bálsamo. Elas também são chamadas de água do leite de uma mulher que deu à luz uma criança do sexo masculino, água do leite de vaca preta, água de urina de bezerra, ou de ovelha, ou de asno, água de cal viva, de mármore, de tártaro, de sandáraca (realgar, sulfeto de arsênico), de alume xistoso, de salitre, de leite de jumenta, de cabra, de cinzas de cal, águas de cinzas, de mel e oximel (uma mistura de vinagre e mel), de flores de bardana, de safira etc. As vasilhas ou os instrumentos destinados a essas combinações devem ser de vidro. Deve-se tomar cuidado em não mexer a mistura com as mãos, porque o mercúrio é letal, assim como o ouro nele encontrado é corrompido.

Maria, a Alquimista

 Embora boa parte dessa notável passagem permaneça obscura, Maria aparece nela não somente como uma perita praticante de alquimia, mas também como uma pessoa que tinha grande conhecimento de suas tradições e ensinamentos.

Quanto aos procedimentos alquímicos empregados, descritos e recomendados por Maria, além dos métodos antigos para a execução da Grande Obra, como a colocação de metais básicos em estrume de vaca, ou esterco de cavalo, ou em um banho de cinzas (thermospodion) e outras técnicas como essas, ela também empregava vários novos procedimentos que, de acordo com autores posteriores, ela mesma inventara.

Maria ensinou que a Grande Obra só pode ser executada em uma estação específica do ano, no mês egípcio de pharmuthi (que corresponde a março-abril).

Os materiais devem ser envolvidos firmemente em linho, depois curtidos em sal (taricheia) e, por fim, cozidos em “água de ponto”. No decorrer da transformação, diz Maria, um quarto ou mesmo um terço, dos materiais se perde, mas o restante pode ser multiplicado por meio da diplose (duplicação) de Maria. Essa duplicação pode ser realizada com mercúrio e, em particular, com uma liga de quatro metais, que ela chama de “nosso chumbo”.

Esses quatro metais, cobre, ferro, chumbo e zinco, constituem a tetrassomia. Eles são “quatro em um”, disse Maria, de acordo com Olimpiodoro, e, por essa razão, são denominados “ovo dos filósofos”, porque também o ovo é constituído por quatro componentes: a casca, a pele, a clara e a gema.

Essa mistura pode ser preparada por meio do “nosso chumbo”, termo que designa tanto o “chumbo preto” (molybdos melas)quanto o antimônio (molybdos hemeteros) que, no estado fundido, também é denominado “mistura negra” ou “sumo negro”. Os quatro metais são, de acordo com Maria, denominados também “nosso cobre”, ou o “cobre deles”, assemelhando-se, em sua composição quádrupla, ao corpo humano.

Para se fazer ouro, a tetrassomia deve ser aquecida e “calcinada” junto com certas substâncias: com o enxofre, que se evapora no calor por si próprio e, assim, colore tudo, duas características que ele compartilha com “todos os materiais sulfurosos”; com o mercúrio; com o “alume granular”, isto é, partículas de ácido arsênico extraídas dos sulfetos de arsênico; com a água divina, que sempre pode significar uma solução ou uma liga derretida, preparada com a fumaça ou fuligem (aithale) de substâncias contendo enxofre ou arsênico, com a adição de ácido sulfúrico (chalkanthos) ou duas substâncias denominadas galha e kiki (a palavra egípcia para a planta mamona).

Voltando aos materiais com os quais, de acordo com Maria, “nosso chumbo” e “nosso cobre”, devem ser tratados, entre eles estão o alabastro (provavelmente um óxido branco de antimônio) e o stimmi (sulfeto de antimônio), que se assemelha ao enxofre.

Quando nutrido de forma apropriada com sólidos e líquidos, o cobre passa por uma mudança de cor, em quatro fases: ele se torna, sucessivamente, preto, branco, amarelo e vermelho. Essas metamorfoses devem ser consideradas como “efeitos da pedra”, isto é, do pó composto preparado pelo filósofo, que o espalha sobre o “cobre”, efetuando assim a transformação cuja essência consiste em um casamento, ou seja, a “união da fêmea com o macho”, porque a ”natureza atrai, domina e conquista a natureza”.

Outro procedimento que Maria ou inventou ou aprendeu com os antigos alquimistas e que ela descreveu nos escritos que seriam usados por Zózimo é o método para fazer com que as pedras preciosas brilhem no escuro.

Berthelot acredita que isso provavelmente era feito pela produção de fosforescência temporária, uma vez que Maria recomenda misturas de certas substâncias orgânicas, como a bílis de peixes e tartarugas, o sumo da água-viva, óleo de plantas, resinas e assim por diante, que são todas facilmente oxidáveis se expostas ao ar, deveriam ser acrescentadas às “tinturas e vernizes” na “proporção correta”.

Lippman prefere explicar esse efeito como a luminosidade, frequentemente muito intensa, que persiste, muitas vezes por várias horas, quando certas pedras preciosas, assim como minerais e ligas, são expostas a temperaturas elevadas.


Alquimia, um presente de Deus

Talvez, você esteja se perguntando: existem outros exemplos de grandes mulheres alquimistas?

Sim, é evidente que há.

Cleópatra – possui vários tratados, supostamente, atribuídos a ela.

Paphnutia e Theosebeia (irmã de Zózimo) – dedicavam-se intensamente à Alquimia.

Pernelle (esposa de Nicolas Flamel) – desempenhou um papel tão importante quanto o marido para a consecução da Obra.

Mary Atwood – Uma inglesa do século 19. Na IHSA, existe um livro inteiro dedicado aos seus escritos herméticos.

Hoje, inúmeras mulheres se dedicam ao estudo e prática dos preceitos herméticos. Nunca, dentro da Tradição Alquímica, existiu qualquer tipo de distinção.

Para Maria, a Alquimia é um presente ou dom de Deus, o donum Dei.

Ou seja, para evoluirmos na Sagrada Arte, é fundamental que sejamos favorecidos pela intervenção divina.

O único trabalho do alquimista é merecer!

O um se torna dois, o dois se torna três e, por meio do terceiro e do quarto, conquista a unidade; assim, dois é o mesmo que um.

Maria, a Alquimista

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Créditos Alquimia Operativa.

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